O poema “O Corvo” (1845), do poeta
romântico norte-americano Edgar Allan Poe (1809-1849), narra a história de um
viúvo que, durante uma sombria madrugada, recebe uma estranha visita em seu
cômodo: um corvo, mensageiro do mundo dos mortos. A ave pousa sob o busto de
Palas Atenas – que na mitologia grega é a deusa da Razão – e observa friamente
ao viúvo. Este, imediatamente pergunta ao corvo, ave das trevas, sobre o
destino de sua finada esposa: Leonora. O viúvo pergunta-lhe também se um dia
voltará a vê-la, se tornará a sentir o calor de sua presença e a vitalidade do
amor experimentado na juventude, vivido ao lado de sua amada. Mas a única
resposta do corvo é um lacônico: "Nunca mais!"
"Nunca mais" é a resposta que
o tempo nos dá às recordações passadas. "Nunca mais" é a assertiva
inclemente que a vida dá para os abraços sonhados, os amores não dados e os
tempos desperdiçados. Bem como há um "nunca mais" para tudo de bom
que se foi vivido, e que hoje, não é mais. "Nunca mais" o ontem.
"Nunca mais" o hoje. E "nunca mais" será o amanhã vivido
como se fosse eterno, pois a lição do corvo de Edgar Allan Poe é esta: a vida
se esvai e nunca mais retorna.

Outra célebre personagem que constatou
a inércia da Razão frente ao corvo da morte foi o russo Ivan Ilicht, criado por
Liev Tolstoi (1828-1910) em sua obra “A
morte de Ivan Ilicht”, que em seu leito de morte reflete:

Dessa forma, podemos constatar que para
Poe, nem o busto de Atenas (a razão) é capaz de espantar ao corvo sombrio (a
morte) e suas cortantes palavras: "Nunca mais". Sendo assim, a lição
do corvo ao viúvo de Poe continua atual, em todas as noites, em todos os
momentos de fragilidade, em todas as lembranças nostálgicas de um passado bem
melhor que o atual presente, e em todas as noites em claro por causa de
preocupações futuras: "Nunca mais!". O tempo escorre... E a vida, uma
vez que se vai, "nunca mais".
Autor: Arnin Braga
[1] ASSIS, Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: Egéria, 1978, p.
75.
[2] TOLSTOI, Liev. A Morte de Ivan
Ilitch. Tradução: Marques Rebelo. E-book, cap. VI, pp. 31-33.
*Ilustrações de 1875 do pintor impressionista francês Édouard
Manet (1832-1883), feitas para a versão francesa do poema “O Corvo”, de Edgar
Allan Poe.